Divinas ilusões, de Ana Centeno
Leia abaixo um trechinho de "Divinas ilusões", livro que encerra a trilogia escrita por Ana Centeno:
Abril 1988.
Os gaúchos foram embora quando a Comunidade acabou. Eu permaneci na cidade, como caseira dos canoeiros que viviam em Goiânia e somente apareciam em feriados e fins de semana, para descer o Rio das Borboletas.
A chácara que eles alugaram é linda! Rodeada por ciprestes perfumados e um pomar rico em mangas, abacates, bananas e limões. Uma construção rústica e ampla, iluminada por muitas janelas, conta ainda com um mezanino enorme, uma suíte, com vista para as montanhas. E, nos fundos do terreno, entre os cajueiros, uma casinha, antes atelier, agora meu harém, como foi batizado por Nelson.
Gastei muito suor até livra-la de toda a tralha e pó acumulados por meses sem uso e, dispor os livros e demais objetos, que eu ainda acumulo, pelas longas prateleiras de madeira fixadas à parede.Com os quadros nas paredes e os baús organizados, parti para a casa grande.Após mais dois dias de faxina, a casa estava pronta, esperando os meus “homens”, os canoeiros.
Mas eles não vieram. E acabei na balada, concluindo em uma noite de paixão com um leonino que conheci no banco. Olhara aquele homem grisalho e encantara-me com seus límpidos olhos azuis. Ficara admirando seus traços clássicos, a cabeça leonina, o chapéu de feltro preto, displicentemente jogado de um lado para o outro ao sabor da conversa.
Pena que Júlio é casado. E, com uma mulher que eu conheço.
Fiquei arrependida de, mais uma vez, envolver-me com um homem casado. Decidi não mais vê-lo. E, quando ele voltou no meio da semana, ao anoitecer, tratei-o com carinho, mas lhe expus meus escrúpulos. Cheguei a falar em adultério!
Mas, no fim de semana, já estava arrependida e com saudades dele.
20 de abril.
Na segunda semana de aulas, com nove alunos. Minha escolinha é um sucesso! A idéia de usar a casa grande durante a semana para uma escola maternal foi legal. Afinal, os canoeiros só vem no fim de semana.
. Terceira semana na Chácara dos Canoeiros. Primeiro fim de semana com eles em casa.
No Sábado, fui ao Flash dance. Não encontrei o leonino Julio e não quis aceitar nenhum dos outros. Nenhum me interessava.Só pensava nele. No Domingo, indo para o rio, encontrei-o e fomos tomar cerveja no barracão beira rio. Confessei-lhe minha frustração nos embalos de sábado à noite.Ele perdera sua noite em um aniversário de quinze anos. Rimos de nosso desencontro.
Logo precisei voltar para a casa, pois a Chácara estava lotada pelos canoeiros com suas “namoradas”.
Eu fico babando pelo Paulo!
Ele estava com uma gatinha chocante chamada Kênia. Mas sempre muito atencioso comigo.
- Vou ao Centro. Quere alguma coisa, Alice?
- Se achares um boy legal, pode trazer. – brinquei.
- Mas claro, pode deixar. Embora a casa esteja cheia de boys legais...
Eu lavando louça, ele saindo na moto, com a gatinha, conversando comigo pela janela.
Que diálogo! Chegou a me correr um calor pela espinha. Kundalini acordou.
Eu corro para lhe dar o prato que não acha. Acender o cigarro no fogão, quando não tem fósforos. Sou brilhante o tempo todo, procurando a sua aprovação.
Sábado, na discoteca, ele comentou que eu estava bonita e perfumada. Dançou um pouco com sua gata e foram embora cedo.
No Domingo, ele perguntou se sei fazer “Fondue” e ficou de trazer os ingredientes no próximo fim de semana.
Será que, em algum dia seremos mais do que bons amigos?
Será que isto é o que eu realmente quero? Não será somente ego, mania de conquistar todos os homens interessantes que me aparecem?
Acho mais lógico sufocar estes sonhos românticos, mas o platonismo da relação só faz fortalece-los. Eu o admiro e fico feliz em servi-lo, em usar seu quarto para fazer Ioga. Fico feliz em ler o livro “He”, de Robert A.Johnson, que ele me emprestou. Li-o durante a tarde de segunda-feira, feriado, enquanto ele divertia-se com a gatinha na Cachoeira do Gnomo.
Senti um prazer orgulhoso quando Kênia, que ficou minha amiga, puxou assunto sobre o fim de semana, elogiando meu sucesso com os homens na discoteca.
Comentei que no Domingo fora melhor que no Sábado.E ela brincou:
- Geralmente é assim. Quando a gente sai com grandes expectativas, arruma-se toda, nada dá certo. E, quando menos se espera...
Paulo assistia as nossas “frescuras” de mulher sorrindo.Ele entendia de namoricos. Ele é um namorador.
Sobre a autora:
Ana Centeno
Gaúcha com 71 anos, nascida e criada em Rio Grande-RS, onde mora atualmente, após três décadas vivendo no Planalto Central. Bióloga e professora aposentada, dedica-se à literatura e arteterapia. Publicou em 2024, com a Editora Libertinagem, "Decameron Subtropical " e "Mutações no cerrado ".
Informações do produto:
Capa comum: 280 páginas
Editora Libertinagem: 1ª edição
São Paulo: março de 2025
Formato 14x21cm
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