Meu amor do Leste, de Lara Muntaser

 
         Retornou lentamente à cama, amaldiçoando-se. Afofou o travesseiro e deitou-se de barriga para cima. Tentou recordar o dia anterior e de como havia se metido em uma bebedeira dessas no meio da semana. As memórias escapavam-lhe odiosamente. Essa era a pior parte! Dava controle a todo mundo e tirava o seu próprio. Sabia que havia estado com Heitor, mas o que mais? O que haviam feito? Por que bebera tanto? A que horas tinha vindo para casa? E o carro? Precisava descer para ver se ele estava na garagem. Se estava intacto. Mas iria depois. Não havia recebido nenhum chamado da portaria. A essa altura, não tinha mais poder de evitar nenhum estrago. 
 
          Era como estar gravemente doente, como todo ser humano ressaqueado que estava chegando aos 30. Quando tinha 20, a ressaca durava algumas horas e depois ainda conseguia dar uma boa corrida no parque, no mesmo dia. Bons tempos! As coisas não eram mais assim. De olhos fechados, rezou para o corpo reagir sozinho, pois ela mesma não havia feito nada além de vomitar para melhorar. 
 
Virou de lado e sentiu como se tivesse bolas de gude dentro da cabeça, batendo em seu crânio por dentro. Gemeu de dor. A ideia de ficar assim por horas era inconcebível. Criou coragem e levantou-se de novo com as forças que restavam. Cozinha, duas pílulas. Uma para enjoo, uma para a cabeça. Pegou uma garrafa de água gelada e voltou à cama. “Quanta humilhação passo sozinha nessa casa”, pensou. Benji veio caminhando para o quarto, desconfiado. “Bom, sozinha não. Ainda bem que você guarda segredo.” O vira-lata caramelo chegou perto de sua cama com um olhar investigativo, abanando o rabo devagar. Recebeu o carinho que pedia e deitou-se ali mesmo, observando-a.